Archive for abril \17\-03:00 2014
A Refinaria de Pasadena – Missing the Point
Prezados leitores,
Tenho acompanhado atentamente, desde o início, esse imbróglio a respeito da compra da refinaria. Já fui investigar os dados, mas esbarrei na falta de informações sobre o índice de complexidade da refinaria, para ver se o preço era mesmo justo.
Mas ontem, as explicações dadas pelo Sr. Nestor Cerveró deram uma pista de qual deveria ser o caminho da investigação, seja em CPI ou processo administrativo.
O ponto não é saber se foi um bom ou mau negócio!
Pelo que disse o ex-diretor, eu não buscaria responsabilizá-lo, ou à diretoria executiva, pelo resultado pífio do negócio, mas, PRINCIPALMENTE, pela condução temerária do negócio, desde a formatação do contrato até os passos que derem o direito de exercício da Put Option.
Sem querer julgar as intenções da diretoria, pelo que se sabe até agora, o contrato e as ações posteriores da Petrobras não deixam muita dúvida de que o negócio foi conduzido de tal forma que acabou por beneficiar apenas os sócios, em detrimento da Companhia.
E isso é muito mais grave do que um plano de negócios mal feito ou uma imprevidência nos cálculos de VPL ou TIR.
É mais grave porque não depende de condições de mercado, mas de arbítrio da própria direção.
Onde a história não fecha?
As cláusulas “irrelevantes”
Cerveró diz que as cláusulas foram omitidas, por serem comuns e pouco relevantes. Isso é papo de advogado. Não é a existência da cláusula que deve ser revelada, mas as condições dela. E as condições SEMPRE são relevantes.
E se, em vez de 6,9% de rentabilidade garantida ao sócio por ano, fosse 18,5%?
E se, em vez de US$ 700 milhões para comprar os outros 50% fossem US$ 2,5 bilhões?
Não importa se a cláusula é padrão, os valores são negociados e podem ser bons ou ruins para a empresa. Suas CONDIÇÕES deveriam ser explicitadas no resumo executivo, e isso é inegável. E não foi feito.
A farsa do “prejuízo contábil”.
Mais um papo de advogado ontem. A todo instante, o ex-diretor e a presidente da empresa, indicaram que houve apenas “prejuízo contábil”.
Well…
É prejuízo contábil, mas é prejuízo. A Petrobras tem prejuízo operacional na operação de importação e venda de combustíveis, por exemplo. É perda de caixa todo ano.
No caso da baixa contábil a valor justo (impairment) da refinaria, não sai caixa, mas também é prejuízo.
A única diferença é que, em vez de ser perda de caixa nesse período, você está assumindo que rasgou dinheiro no passado. O dinheiro saiu sim!
Outra coisa interessante é dizer que o negócio não foi de todo ruim, pois “tem um ativo lá”, que refina 100 mil bpd! Ora, acho que os acionistas que compraram OGX no IPO e mantiveram as ações, entendem que “ter um ativo lá” pode não significar grande coisa… Papo de advogado, sem fundamento e sem coerência financeira.
Não é razoável (e em minha opinião, nem honesto) tentar confundir o acionista e o público em geral, com essa falácia de “prejuízo contábil” como se não fosse EFETIVAMENTE prejuízo. Não só é, como é prejuízo auditado, publicado e inequívoco!
Dediquei um capítulo a essas baixas contábeis no meu livro “O Mercado de Ações em 25 Episódios”.
As falhas do plano de negócios e as decisões inacreditáveis da diretoria…
O Sr. Cerveró passou o tempo inteiro tentando convencer aos interessados de que o plano foi minuciosamente preparado por 1 ano e que foi “aprovado” por consultorias internacionais.
Essa parte da “aprovação” das consultorias é mentira mesmo, nem vale analisar. As ressalvas do Citibank indicam que toda a análise foi feita com dados enviados pelo próprio interessado (Petrobras ou diretoria da Petrobras). Não significa que avaliaram o negócio em si, mas o negócio que o próprio interessado apresentou. É óbvio que isso não avaliza o negócio, mas apenas a visão que a diretoria tinha do negócio. E como é ela que está na berlinda…
É o mesmo que roubar um banco às 19:00h, dizer a um tio distante que nessa hora você estava no cinema, e usar o testemunho do tio para se livrar da acusação. O testemunho, na verdade, é seu mesmo e não do seu tio. Ou do Citibank.
Foi dito que o plano foi elaborado minuciosamente por 1 ano. Ótimo!
Em princípio, calcularam que o negócio era bom, a refinaria seria usada para refinar óleo pesado. Com certeza foi isso que analisaram no plano e, pelo que entendi, foi isso que foi acertado com o sócio.
Eis que, 6 meses depois, o Sr. Cerveró afirma que apareceu um novo plano de negócios indicando que o VPL seria muito maior se, em vez de processar o óleo pesado, a capacidade da refinaria fosse aumentada para 200 mil bpd.
E para isso outros tantos bilhões seriam investidos.
Segundo ele, isso deu direito de exercício da Put Option, pois o acordo inicial não foi honrado e a sócia não queria investir nesse novo plano, segundo Cerveró, MUITO MELHOR!
Causa espécie, causa mesmo, que um plano de negócios minuciosamente preparado não tenha, ao menos, analisado a hipótese de ampliar a capacidade de refino. É meio básico que, quando se compra um negócio, aumentar a produção costuma ser colocado como cenário no plano de negócios.
Como é que, em apenas 6 meses, apareceu um outro plano de negócios MUITO melhor que o primeiro? O que foi feito do primeiro plano? Por que esse cenário óbvio não foi contemplado no plano anterior?
Será que, ao considerar esse novo plano, os executivos consideraram a hipótese do exercício da Put Option e a necessidade de investir SOZINHO?
Isso é trivial em finanças, é custo a considerar. Será que o VPL positivo se manteria pagando caro pela saída do sócio e investindo (segundo estimativas) mais 2 bilhões de dólares para ampliar a capacidade?
E mais, no momento em que a sócia negou o interesse, por que o plano original não foi mantido e evitou o exercício da Put Option? Eles não foram consultados antes? A Petrobras nem debateu com o sócio um novo plano para a refinaria que era 50%-50%?
E se debateu com o sócio, e o exercício foi de comum acordo, por que o Conselho peitou e foi para a arbitragem e para os tribunais? Não dá para crer que Conselho e Diretoria estivessem do mesmo lado.
Se o projeto inicial era bom, tinha VPL positivo (o que eles afirmam a toda hora), por que não voltaram com ele, mantendo o sócio, e ganhando dinheiro?
A justificativa para a não continuidade NÃO PODE ser o Pré-sal, que foi informado no final de 2007, muito menos a derrocada das margens nas refinarias, que se iniciou em 2008. Isso tudo aconteceu no final de 2006 e início de 2007.
A estranha história das assinaturas…
Parece que o tribunal de contas interpelou o executivo por ter assinado sozinho uma “carta de intenções”, em desacordo com o que exige o Estatuto da empresa (duas assinaturas), propondo pagar US$ 700 milhões pelos 50% da sócia.
Certamente o advogado dele não o preparou para responder isso, pois é, no mínimo, estranho afirmar que uma carta de intenções da Petrobras, propondo desembolso de US$ 700 milhões, não signifique EXATAMENTE o que está escrito, ou seja, a intenção da Companhia de pagar esse valor.
Não é “conversa fiada” ou “conversa jogada fora”, não é um documento-meio, uma ideia solta, é uma oferta bilionária (em R$). Não faz qualquer sentido que tenha assinado sozinho. Só o fez se isso não representasse o interesse de toda a diretoria, ou se fosse para negar a validade do documento em tribunal posteriormente. O que deu errado.
Talvez a maior prova de que aquilo não representava o interesse de Companhia, foi a negativa de pagamento, e de acordo, por parte do Conselho, o que levou a coisa aos tribunais.
O futuro não ajudou…
Todo o palavrório em torno do novo plano de negócios, com refino de 200 mil bpd etc., foi por água abaixo, pois a refinaria continua com a mesma capacidade, e ainda teve que receber, segundo a presidente, mais US$ 550-600 milhões em investimento.
Tem rabo, focinho, barriga e pé de porco…
Ou é porco, ou é feijoada!
Se um marciano, com boa capacidade matemática e lógica, conhecesse os detalhes da operação, mesmo sem saber do histórico das empresas e das ligações políticas, pensaria o quê?
- Que o negócio foi feito, prioritariamente, no interesse da sócia? Creio que a afirmativa da Astra, em documento oficial, de que o negócio suplantou qualquer expectativa racional, poderia indicar isso.
- Que as cláusulas, em nenhum momento, protegiam a Petrobras? Bom, como ela perdeu até a última instância, parece razoável crer nisso.
- Que o interesse da diretoria, ou de alguns membros, era divergente do interesse dos acionistas (representados pelo Conselho)? Sem dúvida, o Conselho posteriormente atropelou as decisões da diretoria e o interesse de “pagar” sem litígio a Put, em documento assinado, estranhamente, por apenas um diretor. Vale perguntar, quem sabia dessa oferta assinada por Cerveró?
- Que o foco, na verdade, era forçar uma venda integral da refinaria, com um ganho extraordinário, nunca foi levar adiante a sociedade? Ora… a Put foi exercida por conta de uma mudança radical no plano de negócios, menos de 6 meses depois de todos os estudos que levaram à compra. A própria Petrobras, em documento que o TCU considera irregular, quis pagar os US$ 700 milhões rapidamente após a mudança na estratégia, sem arbitragem e sem litígio.
Bom, são apenas suposições.
Mas uma coisa é inegável. Mesmo considerando alguns números esquisitíssimos, os US$ 42 milhões iniciais da compra da Refinaria, já viraram US$ 120 milhões e, agora, tanto a presidente quanto o ex-diretor, afirmam que a refinaria custou à Astra US$ 360 milhões, ainda assim, do ponto de vista da Astra, parece que ganharam na loteria.
Mesmo que tivessem pagado US$ 360 milhões, pintou um sócio que pagou US$ 412 milhões por 50% e concedeu uma opção de venda (Put Option) de mais US$ 700 milhões pelos 50% restantes. Esse mesmo sócio, resolve brigar com você 6 meses depois, dando o direito de exercer aquela Put (que é ótima para a Astra!). Esse mesmo sócio opera, em documento assinado por apenas um diretor, para pagar sem reclamar US$ 700 milhões.
Ora, que empresa sortuda, não?
Bom, pode ser porco ou feijoada. Mas certamente não é a Brastemp ou a Gisele Bundchen que estão querendo vender!
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