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Bolha imobiliária: O bizarro mercado imobiliário da Zona Sul do Rio e sua comparação com o mercado de São Paulo.

Posted on 18/10/2016. Filed under: Finanças | Tags:, , , , , |

Apesar do derretimento significativo no mercado de aluguéis aqui no Rio de Janeiro, ainda há evidências de que o valor dos imóveis está exageradamente alto, ao menos nas regiões nobres da cidade.

Apesar de ser possível comprar imóveis a preço de 2012, até de 2010 (quem precisa vender baixa), não é difícil achar pedidas de R$ 20.000 o metro quadrado para venda, num mesmo imóvel que se aluga por 40 a 50 reais o metro quadrado, algo como 0,2% e 0,25% ao mês (líquido de IR e custos, algo como 0,14% e 0,17%).

E os imóveis, quase todos, são bem ruins, sem infraestrutura de lazer, garagens precárias e prédios bem antigos e sem modernização.

Comparação com São Paulo

Como todo bom carioca, nascido e criado em Ipanema, numa época bem diferente da de hoje, nunca concebi que São Paulo pudesse competir com o Rio em termos de qualidade de vida.

Mas mudei de opinião nos últimos 15 anos. Aliás, antes nem era uma opinião, era só bairrismo mesmo.

Frequentei bastante a região dos Jardins, Moema, Paraíso, Vilas etc., a partir de 2003 por força do trabalho, e continuo, pois a família da minha mulher é dessa região.

Viajei também por uns 20 estados brasileiros, sempre para as regiões nobres, e para mais de 10 países na América do Norte e Europa.

Com tantas viagens, ficando em bons hotéis e regiões prestigiadas, percebi que São Paulo, em termos de estrutura de lazer, bares, comércio sofisticado etc., não tem comparação com nenhum lugar do Brasil. O Rio com certeza vem na segunda posição, mas com não mais que 15% da oferta de São Paulo. Não estaria errado de dizer que apenas o distrito de Moema tem mais ofertas de serviços sofisticados do que todo o Rio de Janeiro.

Normalmente o mercado imobiliário costuma ser mais pujante em torno de centros de excelência de serviços, colégios, comércio e, principalmente, de onde se ganha dinheiro.

E também pelo glamour das regiões. Por isso é tão caro morar bem em Paris, Nova Iorque e Londres.

Qual é a diferença entre os mercados imobiliários do Rio e de São Paulo?

É colossal. Tanto quantitativamente quanto em qualidade.

Separei 1 região de São Paulo e 2 do Rio para compararmos.

Deixei de fora áreas de metro quadrado mais barato (ou menos caro), como Barra da Tijuca, Recreio, Granjas, Alphaville, Morumbi, Panamby etc. e me fixei nas regiões mais caras das cidades.

Em São Paulo peguei os distritos que cercam o Ibirapuera, Vila Mariana, Moema, Jardim Paulista e Itaim Bibi. Essencialmente os jardins e as vilas. É inegavelmente a região de metro quadrado mais caro e, para quem conhece, e sem dúvida uma região MUITO nobre. Chamaremos de SP01.

No Rio precisei separar o United Kingdom of Ipanema do resto da Zona Sul, pois não fazem parte do mesmo mercado imobiliário. Apesar de todos serem próximos da praia, o UKI custa, facilmente, o dobro.

No UKI teremos Ipanema, condado central, Leblon, Lagoa, Jardim Botânico, Gávea e Urca. Chamaremos de UKI.

No restante da zona sul temos Copacabana,  Botafogo, Flamengo, Laranjeiras, Catete, Leme, Glória, Humaitá e Cosme Velho. Chamaremos de RJ01.

Características demográficas e de oferta de imóveis.

Em SP01 moram aproximadamente 342.000 pessoas, em RJ01 moram 390.000 e no UKI cerca de 150.000.

Utilizei o site www.vivareal.com.br para fazer as comparações, pois me parece mais completo e com mais ofertas que o ZAP.

Não vou falar de “imóveis” à venda, mas de “ofertas”. Às vezes um imóvel aparece mais de uma vez, o que distorce o número real de imóveis à venda. Outra coisa importante é que peguei APENAS apartamentos, nada de casas ou imóveis comerciais.

Número de anúncios de imóveis por região

SP01: 68.181 para venda, 54.579 para alugar (80%).

RJ01: 21.747 para venda, 3.539 para alugar (16%).

UKI: 10.317 para venda, 3.762 para alugar (36%).

Filtro 1: Com garagem

SP01: 65.713 de 68.181 tem garagem,  96% do total.

RJ01: 12.138 de 21.747 tem garagem, 56% do total.

UKI: 8.503 de 10.317 tem garagem, 82% do total.

Filtro 2: Imóveis acima de R$ 3 milhões com garagem.

SP01: 14% das ofertas são de imóveis acima de R$ 3 milhões.

RJ01: 11% das ofertas são de imóveis acima de R$ 3 milhões.

UKI: 42% das ofertas são de imóveis acima de R$ 3 milhões.

Filtro 3: Imóveis abaixo de R$ 1.200.000 com garagem.

SP01: 29.491 de 68.181,  43% do total.

RJ01: 3.656 de 21.747, 17% do total.

UKI: 324 de 10.317, 3% do total.

Filtro 4: Imóveis abaixo de R$ 1.200.000 com garagem, com mais de 120 metros quadrados de área.

SP01: 3.529 de 68.181,  5,18% do total.

RJ01: 261 de 21.747, 1,20% do total.

UKI: 1 de 10.317, 0,01% do total.

Filtro 5: Aluguel superior a R$ 5.000

SP01: 12.123 de 54.579,  22% do total.

RJ01: 883 de 3.539, 25% do total.

UKI: 2.399 de 3.762, 64% do total.

 

Filtros mais específicos.

Antes de falarmos da questão qualitativa, mais alguns filtros para mostrar a diferença entre os mercados.

3 Quartos ou mais com garagem, entre 90 e 120 metros quadrados de área.

Em SP01 há 9.988 anúncios com essas características, indo do mais caro, a R$ 3,2 mihões ao mais barato a R$ 435.000.

Em termos de aluguel há 2.864 anúncios com essas características em SP01, variando de um máximo de R$ 15.000 a um mínimo de R$ 1.600.

Em RJ01 há 2.716 anúncios com essas características, indo do mais caro, a R$ 4,2 mihões ao mais barato a R$ 750.000.

Em termos de aluguel há 262 anúncios com essas características em RJ01, variando de um máximo de R$ 12.000 a um mínimo de R$ 2.600.

No UKI há 1.834 anúncios com essas características, indo do mais caro, a R$ 7 mihões ao mais barato a R$ 950.000.

Em termos de aluguel há 313 anúncios com essas características no UKI, variando de um máximo de R$ 12.000 a um mínimo de R$ 3.000.

 

Aqui já aparece a primeira inconsistência financeira.

O que fica evidente ao avaliar ofertas do tipo “vendo ou alugo”, que são abundantes em São Paulo e mais raras no Rio, é que o aluguel em São Paulo é mais caro. Por quê?

Porque não vale a pena alugar no RJ. Não é “indiferente” alugar ou vender no RJ, mas em São Paulo é.

E isso fica um pouco claro quando vemos que os imóveis, nas características propostas, têm aluguel mais caro em SP do que nas regiões nobres do Rio.

É fácil achar imóveis com o aluguel oscilando entre 0,4% e 0,5% do valor de pedida de venda em São Paulo e impossível no Rio. Ao contrário, no RJ é facílimo achar imóveis sendo alugados por 0,25% de seu valor de pedida.

A lógica é simples. Circula mais dinheiro por lá. Aluguel é poder aquisitivo, é renda, já compra de imóvel é crédito e estoque de capital.

Mas o que impressiona não são nem os números, mas a qualidade dos imóveis. Veja nos exemplos a seguir.

O que é possível comprar entre R$ 900.000 e R$ 950.000 (3 quartos ou mais com garagem)?

Tentei escolher os melhores. Em São Paulo não foi possível escolher, pois há muita oferta de bons imóveis.

No UKI não foi possível escolher, pois não há aptos nesse valor com essas características.

No RJ01 não havia nada que prestasse. Mas selecionei alguns.

RJ01

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-botafogo-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-80m2-venda-RS950000-id-73163387/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-botafogo-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-162m2-venda-RS900000-id-72248034/

SP01

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-jardim-paulista-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-140m2-venda-RS950000-id-69135011/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-4-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-166m2-venda-RS950000-id-67833949/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-152m2-venda-RS930000-id-59579574/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-158m2-venda-RS920000-id-58921734/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-moema-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-130m2-venda-RS950000-id-47794627/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-124m2-venda-RS950000-id-56403699/

 

O que é possível comprar entre R$ 1.450.000 e R$ 1.550.000 (3 quartos ou mais com garagem)?

Tentei escolher os melhores. Em São Paulo não foi possível escolher, pois há muita oferta de bons imóveis.

No UKI e no RJ01 há boas opções, muito inferiores às de SP01, mas bem melhores que nas outras faixas de preço. No UKI só havia 17 aptos à venda nessas características, 3 aptos muito bons.

RJ01

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-flamengo-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-180m2-venda-RS1550000-id-63845539/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-botafogo-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-90m2-venda-RS1550000-id-58718845/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-copacabana-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-110m2-venda-RS1550000-id-71938266/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-copacabana-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-98m2-venda-RS1550000-id-71451902/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-leme-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-100m2-venda-RS1550000-id-73017934/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-botafogo-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-115m2-venda-RS1550000-id-70462561/

UKI

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-4-quartos-gavea-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-178m2-venda-RS1500000-id-66689613/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-lagoa-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-132m2-venda-RS1500000-id-71919036/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-gavea-zona-sul-rio-de-janeiro-com-garagem-120m2-venda-RS1450000-id-72315390/

SP01

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-334m2-venda-RS1550000-id-71793706/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-4-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-218m2-venda-RS1500000-id-57117165/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-vila-mariana-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-186m2-venda-RS1450000-id-65008497/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-jardim-paulista-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-225m2-venda-RS1450000-id-73363662/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-4-quartos-moema-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-180m2-venda-RS1450000-id-71729150/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-moema-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-204m2-venda-RS1460000-id-57000739/

https://www.vivareal.com.br/imovel/apartamento-3-quartos-jardim-paulista-zona-sul-sao-paulo-com-garagem-186m2-venda-RS1498000-id-69114756/

 

O que podemos concluir disso?

É difícil entender tamanha discrepância, ainda mais quando sabemos que em São Paulo há muito mais dinheiro circulando e menos violência do que no Rio, segundo os dados do ministério da justiça.

Pode ser a praia e o lazer gratuito, apesar dos arrastões frequentes.

Pode ser o Tom Jobim e sua garota.

Pode ser excesso de oferta de um lado, falta de outro. Mas aí teríamos que ponderar com a demanda, para a qual não temos os dados. E também fica difícil entender por que o aluguel seria mais caro, dado que também tem bem mais ofertas do que no Rio.

Talvez seja o efeito NYC. A pessoa rica tem um apartamento lá só por ter. Não há necessidade de racionalidade financeira ou de moradia.

Mas, infelizmente, e quem conhece sabe, nem Rio e nem São Paulo são Toronto, o centro de Paris e de Londres, a ilha de Manhattan. Não chegam nem perto da ordem urbana e social desses centros. E, principalmente, não circula uma fração do dinheiro e dos recursos que circula por lá.

O que parece é que em SP há mais equilíbrio entre a racionalidade financeira e a necessidade de moradia, já no Rio não parece haver. Parece ser outra coisa.

Faz sentido comprar para morar ou para investir em São Paulo, dado o retorno possível com aluguéis, já no Rio me parece que não há sentido em comprar, uma vez que o aluguel corresponde a 0,25, 0,25% do valor do imóvel.

Quais apostas podemos fazer?

Após a crise braba que o Brasil está passando, os preços dos imóveis vão subir em São Paulo? Cair no Rio?

Ou vocês acreditam que essa diferença se sustenta apenas pelo diferencial geográfico?

A minha aposta é que, em algum momento, haverá equilíbrio financeiro, como sempre houve, entre o preço dos aluguéis e de venda, em ambas as cidades.

Pelas minhas planilhas, há boas oportunidades de compra em São Paulo e quase nada no Rio de Janeiro, lembrando sempre que as planilhas são meramente financeiras, não captam o Tom e sua garota ou o glamour da princesinha do mar.

Não seria surpreendente se, após essa crise, nos estabilizarmos com alta moderada de preços em São Paulo e baixa no Rio. Sempre levando em conta que há inflação e juros altos no Brasil. Se um imóvel subir 20% em 5 anos, com inflação de 40% e acumulado de juros de 70%, significa queda brutal no preço real.

O problema é o fim da crise. Aqui no Rio não consigo enxergar o fim da crise orçamentária do estado. E isso impacta bastante os preços, pois há insegurança financeira até no serviço público, e medo da deterioração dos serviços, principalmente em relação à segurança.

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PEC 241 e a falácia da tal “fraude na cessão dos créditos tributários”.

Posted on 11/10/2016. Filed under: Finanças, Política | Tags:, , , , , |

Circula nas redes um vídeo que demonstraria uma grande fraude nas contas públicas, com a cessão de créditos tributários podres a entes privados. Veja:

Já há algum tempo alguns entes da federação criaram empresas estatais não dependentes para vender seus créditos tributários, principalmente aqueles de difícil cobrança, vencidos ou parcelados.

Não vou entrar no mérito se houve ou não picaretagem, burla à Lei de Responsabilidade Fiscal ou ao entendimento do Ministério Público de Contas, pois, se houve, com certeza o investidor privado vai ser responsabilizado e vai tomar seu prejuízo.

Mas, assim como a venda de créditos podres da Caixa para o BTG foi cercada de dúvidas à época, e depois vimos a proximidade do Sr. André Esteves com entes do poder público federal, não surpreenderia se houvesse desvios nas operações já feitas.

Ocorre que há total insegurança jurídica no que ocorreu antes, tanto é assim, que há 3 propostas no Congresso, as quais o vídeo quer demonstrar serem fraudulentas, justamente para encerrar essa controvérsia jurídica.

Aliás, se houvesse segurança dos entes que estão fazendo isso, não haveria necessidade de aprovar essas leis.

A tal “operação fraudulenta”

A operação apresentada no vídeo é bastante inverossímil. O investidor pagaria R$ 10.000 por ano recebendo R$ 23.000, também ao ano, num retorno de 130%. É provável que nenhum negócio no mundo, nem ilícitos como exploração da prostituição, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro confiram esse retorno aos tomadores de risco.

Meu conhecimento de CDO (Collateralized Debt Obligation) e de cessão de direitos de recebíveis, me leva a crer que a “garantia” do ente federativo se dá APENAS para a existência e legalidade do crédito e não para o fluxo de recebíveis.

É muito provável, muito mesmo, que a garantia sejam os próprios créditos tributários. Se não for possível reaver, não haverá remuneração das debêntures.

A existência de debêntures subordinadas me parece corroborar isso, pois é a parte que vai absorver as primeiras perdas (como num CDO padrão).

Mas nem vamos nos ater muito a essa questão. Eu realmente acho que a operação, conforme foi explicada no vídeo, é feita de outra forma, não dá retorno exagerado para ninguém e o juro alto é proveniente do risco alto.

Ainda mais porque são operações públicas, com contratos públicos, escrituradores autorizados, dentro do sistema financeiro regulado etc.

Parece bullshit, mas nem precisamos entrar nos detalhes dessa “fraude” inverossímil.

A nova legislação

O PLP 181/2015 e o PL 3337/2015 são projetos de origem na antiga situação, no PT e aliados. Vicente Cândido, Jandira Feghali, Sibá Machado, Leonardo Picciani, Celso Russomano etc.

Li os dois projetos, são bem pequenos.

Os projetos visam, simplesmente, permitir a cessão de direitos sobre créditos tributários da dívida ativa consolidada (crédito não pago há bastante tempo).

Isso acontece toda hora com os bancos. E com deságios enormes. Quem ficou devendo muito tempo sabe que não é o banco que cobra, mas uma outra empresa que comprou esses direitos.

Há talvez confusão sobre dois dispositivos:

  • 1º O crédito cedido mantém as garantias e privilégios assegurados à dívida ativa da Fazenda Pública.
  • 3º O cedente responde perante o cessionário somente pela existência e legalidade do crédito.

Manter as garantias e privilégios, ao contrário do que pode parecer, NÃO significa garantia do ente federativo à dívida cedida. É apenas uma forma de garantir que possa ser cobrada, como se dívida tributária fosse, MESMO que fosse cedida. Se não fosse assim, o ente privado não teria o direito de cobrar, ou melhor, não teria o direito de impor as restrições que são privativas do poder público, como multas, impedimento de participar de licitações etc.

Tanto é assim, que o parágrafo terceiro deixa claro que o poder público só responde pela existência e legalidade dos créditos, não por seu adimplemento.

O outro PL tão somente detalha melhor as condições para a União fazer a cessão, e fala sobre o processo de leilão desses créditos, o que deveria garantir ao menos um preço justo aos créditos.

O PLS 204/2016 de José Serra

Não vi nada desabonador nos projetos anteriores. Parece-me uma forma de ajudar o governo a receber créditos já devidos (de forma que não é antecipação de receitas) de difícil execução, ainda que com grande deságio, como fazem TODAS AS INSTITUIÇÕES financeiras ao redor do mundo.

Há estimativa de receber até 110 bilhões com a dívida ativa da União.

E é até interessante passar para o interesse privado essa cobrança, pois, como sabemos, às vezes os órgãos públicos ficam sob influência de interesses não republicanos, como vimos recentemente no CARF, esquema desvendado pela operação Zelotes da PF.

O PLS do Serra tem ainda menos problemas que os outros e é ainda mais claro. Veja:

Art. 39-A. É permitido aos entes da federação, mediante autorização legislativa, ceder direitos creditórios originados de créditos tributários e não tributários, objeto de parcelamentos administrativos ou judiciais, inscritos ou não em dívida ativa, a pessoas jurídicas de direito privado.

Ou seja, exige autorização legislativa. Não dá para ser uma ação apenas do executivo.

  • 1º Para gozar da permissão de que trata o caput, a cessão deverá observar as características e os limites seguintes:

I – não modificar a natureza do crédito que originou o direito creditório objeto da cessão, o qual manterá suas garantias e privilégios;

II – não alterar as condições de pagamento, critérios de atualização e data de vencimento, nem transferir a prerrogativa de cobrança judicial e extrajudicial dos créditos originadores, que permanece com os órgãos que detenham essa competência;

III – corresponder a operações definitivas e que não acarretem para o cedente a responsabilidade pelo efetivo pagamento a cargo do contribuinte ou de qualquer outra espécie de compromisso financeiro; e

IV – compreender apenas o direito autônomo ao recebimento do crédito e recair somente sobre o produto de créditos tributários cujo fato gerador já tenha ocorrido e créditos não tributários vencidos, efetivamente constituídos, e reconhecidos pelo contribuinte ou devedor mediante a formalização de parcelamento.

Releia a parte grifada.

Qual é a parte de “não acarretar para o cedente a responsabilidade pelo pagamento a cargo do contribuinte ou QUALQUER OUTRA ESPÉCIE DE COMPROMISSO FINANCEIRO”, que não ficou clara?

Cadê o pagamento de juros, cadê a dívida gerada?

Não significa que não possa haver picaretagem

No Brasil temos leis excelentes, como a LRF por exemplo. Dilma rasgou a mesma, tentando dar ares de normalidade, tanto é que, mesmo com todos os rombos decorrentes nas contas públicas, ainda se fala em golpe.

Não é a lei, que me parece EXCELENTE, que faz a picaretagem acontecer, é o agente público.

Se as empresas securitizadoras virarem cabides de empregos e precisarem de aportes do ente federativo para pagar salários, será patético. Se pagarem régias comissões e salários, será patético. Se houver conluio na licitação, será fraude.

Tudo o que sempre ocorre, com as leis que já temos.

Mas a fraude não está nas linhas da lei, mas na ação desses agentes corruptos que os próprios brasileiros, reiteradas vezes, colocam no poder para nos governar.

Essa nossa cleptocracia é que é o problema, não uma legislação simplória para gerir um modelo trivial de cessão de direitos creditórios (abundante no mercado privado) e de montagem de CDOs.

Quanto ao ministério público de contas

Sou da área de finanças. Entendo de produto financeiro. Por isso tenho bastante segurança de que aquele modelo que remunera o investidor em 130% ao ano NÃO EXISTE, foi uma má interpretação dos criadores do vídeo.

Se fosse algo “por baixo dos panos”, ok, mas com contrato público de debêntures, não é provável. Até pode haver essa taxa de juros, mas apenas se o crédito for performado integralmente. Se não for, é prejuízo para o detentor do papel.

Da forma como foi descrita a operação, seria flagrante a burla à Lei de Responsabilidade Fiscal. É a tal fraude com recibo, performada dentro do sistema financeiro regulado, com contratos públicos etc. Ninguém é tão idiota assim.

Não me interessa aqui discutir a legalidade da cessão de dívida tributária a entes privados, há MPs e TJs para debater isso.

Mas, do ponto de vista de finanças públicas, supondo haver lisura nos processos, não há porque impedir os entes federativos de vender um crédito de liquidação duvidosa, como é recorrente no mercado financeiro privado.

Parece-me que os PLs vêm justamente no sentido de sanar os problemas levantados pelos MPs de contas.

Mas é importante lembrar ao MP que não devemos fazer da coisa pública uma “reserva de mercado”, ou seja, não é para trazer tudo para o estado, com fins de aumentar a necessidade de máquina, aumentar os ônus de sucumbência, precisar de mais auditores e procuradores etc..

Não é esse o caminho que o Brasil precisa. Ainda mais hoje.

Aos que pensam o contrário, fiquem à vontade. Mas me parece que o alarde é infundado.

Ah, vale lembrar que não trabalho para CIA, para a NSA, para o BCE, para o FED etc., sou apenas professor de finanças e estou de saco cheio desses falsos dilemas que jogam o Brasil na pobreza.

 

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  • Disclaimer

    Este blog é um ambiente privado para expor opiniões, estudos, reflexões e comentários sobre assuntos ligados a finanças, bolsa de valores, economia, política, música, humor e outros temas.

    Seus objetivos são educacionais ou recreativos, não configurando sob nenhuma hipótese recomendação de investimento.

    O investidor consciente deve tomar decisões com base em suas próprias crenças e premissas. Tudo que lê ou ouve pode ser levado em consideração, mas a decisão de investimento é sempre pessoal. Tanto na escolha de ações para carteira própria, quanto na escolha de gestores profissionais para terceirização da gestão.

    O Autor espera que os temas educacionais do blog possam ajudar no desenvolvimento e no entendimento das nuances do mercado de ações, mas reitera que a responsabilidade pela decisão de investimento é sempre do próprio investidor.

    Sejam bem vindos!

  • Paulo Portinho

    PAULO PORTINHO, engenheiro com mestrado em administração de empresas pela PUC-Rio, é autor do Manual Técnico sobre o Método INI de Investimento em Ações, do livro "O Mercado de Ações em 25 Episódios" e do livro "Quanto Custa Ficar Rico?", os dois últimos pela editora Campus Elsevier.

    Paulo atuou como professor na Pós-graduação de Gestão Social da Universidade Castelo Branco e na Pós-graduação oferecida pela ANBIMA de Capacitação para o Mercado Financeiro.

    Atuou como professor da área de finanças e marketing na Universidade Castelo Branco e no curso de formação de agentes autônomos do SINDICOR.

    Como executivo do Instituto Nacional de Investidores - INI (www.ini.org.br) entre 2003 e 2012, ministrou mais de 500 palestras e cursos sobre o mercado de ações, sendo responsável pelo desenvolvimento do curso sobre o Método INI de Investimento em Ações, conteúdo que havia chegado a mais de 15.000 investidores em todo o país, até o ano de 2012.

    Representou o INI nas reuniões conjuntas de conselho da Federação Mundial de Investidores (www.wfic.org) e da Euroshareholders (www.euroshareholders.org), organizações que congregam quase 1 milhão de investidores em 22 países.

    Atuou como articulista do Informativo do INI, do Blog do INI, da revista Razão de Investir, da revista Investmais, do Jornal Corporativo e do site acionista.com.br. Foi fonte regular para assuntos de educação financeira de veículos como Conta Corrente (Globo News), Infomoney, Programa Sem Censura, Folha de São Paulo, Jornal O Globo, entre outros.

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