VALE – Resultado 3T 2014 e Uso no Método SEMPRE
Aos amigos que compraram o livro “Investimentos para Não Especuladores” e estão utilizando o Método SEMPRE, vou tratar do resultado do terceiro trimestre da VALE, divulgado no último dia 30/10/2014.
IMPORTANTE!
Relembrando que esses comentários são pessoais e não configuram, em hipótese alguma, sugestão ou recomendação. O foco é exclusivamente educativo, com objetivo de fazer o usuário do Método adaptar os resultados, cada vez mais complexos com o IFRS, às sua planilhas do SEMPRE.
Mesmo para os usuários da ferramenta da ADVFN (com lançamento previsto para breve), há necessidade de tratar os dados apresentados pelas Companhias Abertas, pois sempre tem algum dado não recorrente que pode mascarar (para pior ou para melhor) o resultado.
Essa análise mais profunda ajuda o usuário a ter mais “intimidade” com os números da empresa, condição fundamental para o investimento consciente.
Os documentos: Release de Resultados e Notas Explicativas
Notas Explicativas – Ver site CVM
O resultado da VALE trouxe um prejuízo de R$ 3,38 bilhões, ao contrário das estimativas dos analistas, que previam um lucro de cerca de R$ 4 bilhões.
A VALE informa que o resultado reflete “o impacto não-caixa de variações cambiais e perdas monetárias em dívidas e derivativos de R$ 6,223 bilhões devido à depreciação do real frente ao dólar americano.”
A questão é: o que deveríamos considerar como Lucro Recorrente para colocar em nossas planilhas? Se realmente os R$ 6,2 bi pudessem ser “estornados”, a Vale teria um lucro recorrente de quase R$ 3 bilhões, bem melhor que o prejuízo divulgado.
Mas isso requer certo aprofundamento nos números. Vamos a isso!
Ah, não será necessário comentar sobre variações nos preços, redução de dívidas etc., pois o Release é bem claro quanto a isso. A parte cujo entendimento não é tão simples é mesmo a que se refere aos eventos não recorrentes.
Lucro Básico Recorrente
Talvez a forma mais direta seja confiar no julgamento da própria Companhia e usar a linha “Lucro Básico Recorrente” (página 3 do release). A Cia informa R$ 1,497 bilhão para o 3T14 (R$ 8,329 bi no 3T13) e R$ 10,679 bi para o acumulado nos primeiros nove meses (R$ 19,319 bi em 9M13).
Mesmo no lucro recorrente há uma queda grande. No trimestre queda de R$ 6,832 bi e no acumulado, R$ 8,640 bi.
Para saber o acumulado em 12 meses (que vai ser colocado na planilha do método SEMPRE), precisamos buscar o resultado de 2013, no próprio site da Vale. No Release a Cia informa que o Lucro Básico Recorrente de 2013 foi de R$ 26,7 bi.
A forma mais rápida é retirar a “perda” referente aos nove meses (R$ 8,640 bi) do lucro recorrente de 2013, isso equivale a retirar os nove primeiros meses de 2013 e usar os 9 primeiros meses de 2014. O lucro recorrente acumulado para os últimos 12 meses seria, portanto, R$ 18,06 bilhões.
Vale ressaltar que se está apenas aceitando o próprio julgamento da Companhia.
Mas afinal, o que houve com o lucro da VALE?
Responder esta pergunta é fundamental para que o investidor tenha segurança nas premissas assumidas para o Método.
R$ 18 bilhões de lucro recorrente não seriam ruins para uma empresa que vale, aproximadamente, R$ 110 bilhões. Mas, infelizmente, já é o terceiro ano em que fatores não recorrentes têm forte impacto no resultado da VALE. Em 2012 reportou cerca de R$ 9,5 bi de lucro líquido, mas informou que o recorrente seria de cerca de R$ 20 bi. Em 2013, reportou prejuízo de R$ 373 milhões, porém informava no release um lucro recorrente de R$ 26,7 bi.
Qual a importância disso para o investidor?
É que o preço da ação depende do que está por vir. Ele pode se ajustar no curto prazo a perdas não esperadas, mas, se um evento não recorrente zera um lucro de R$ 26,7 bi, por exemplo, é razoável crer que, no futuro, sem a presença daquele evento, o lucro possa retornar.
E no ano de 2013, mesmo com prejuízo, a Vale pagou US$ 4,6 bilhões de dividendos, o que demonstra que havia caixa.
Se o investidor comprou VALE a R$ 50,00 e hoje ela está a R$ 20,00, a atitude racional é se perguntar sobre o futuro e não lamentar sobre o passado. Se ela pode ir de R$ 20,00 a R$ 30,00 em 3 anos, pode soar horrível pelo histórico, mas significaria 50% de ganho em 3 anos!
Ajustes contábeis e perdas com derivativos
Bom… pessoalmente não entendo ambos como sendo “a mesma coisa” para efeitos de cálculo do lucro recorrente. Ajuste contábil por câmbio, tal como registrar em reais a elevação da dívida denominada em dólares, pode ser considerado um evento não recorrente. O efeito caixa é diluído no pagamento da própria dívida. Às vezes durante anos.
Mas o registro de perdas por contabilizar derivativos a preço de mercado, mesmo que se mantenham encarteirados (não realizando o prejuízo) é um pouco mais “caixa” do que a variação da dívida com a desvalorização do Real.
Isso porque os derivativos têm prazos bem mais curtos.
E guardam potencial mais “explosivo”, caso não seja exclusivamente para hedge. Vide casos da Sadia e Aracruz, debatidos no livro “O Mercado de Ações em 25 Episódios”.
O que diz a vale?
A VALE informa que a depreciação do Real (cerca de 11%, dólar médio R$ 2,28) teve um impacto na dívida líquida – dívida denominada em US$ menos contas a receber em US$ – do qual ocorreu uma perda de R$ 4,5 bilhão no 3T14, registrada nas demonstrações financeiras dentro de “Variações monetárias e cambiais”.
Essa parte não traz muita dúvida, pois se o dólar sobe, há impacto no estoque da dívida denominada em US$, que sobe em R$. Uma dívida de US$ 10 bilhões, com o dólar a R$ 2,00, vale no balanço R$ 20 bilhões. Se o dólar for a R$ 2,20, a dívida aumentará para R$ 22 bilhões. Esses R$ 2 bilhões precisam ser contabilizados, mesmo que o prazo da dívida seja muito longo.
Mas também informa perda de R$ 1,719 bilhão com derivativos (swaps de moeda). Essa perda é importante entender, pois pode continuar impactando o balanço e, em algum eventual cenário de estresse para o dólar, trazer perdas ainda maiores.
Coloque-se que o dólar iniciou o 4T14 a R$ 2,45 e, em 06/11/2014, estava cotado a R$ 2,55. Valores muito superiores à média de R$ 2,28, considerada pela VALE para o 3T14.
Nas notas explicativas ao ITR da VALE, página 42, a Cia afirma que usa derivativos para objetivos “não-hedge”, ou seja, não seriam para proteger alguma posição vulnerável em algum ativo.
Essencialmente o que a VALE faz é um contrato com um terceiro em que este se compromete a pagar o montante acertado em R$, com juros atrelados ao CDI ou à TJLP, enquanto a VALE paga o mesmo montante em dólares + uma taxa acertada (cerca de 3,5% ao ano).
A justificativa é a seguinte: Com o objetivo de reduzir a volatilidade do fluxo de caixa, são realizadas operações de swap para converter o fluxo de caixa de dívidas indexadas a TJLP (ou CDI) para US$ em contratos de empréstimos junto ao BNDES (ou outras instituições). Nestas operações, a Vale paga taxas fixas (ou variáveis) em US$ e recebe remuneração atrelada à TJLP (CDI).
Parece que a VALE, por ter a maioria de suas receitas denominadas em dólar e a maioria de seus financiamentos e custos denominados em R$, quer uma garantia de fluxo de caixa em R$, para isso oferece seu fluxo em dólares.
Infelizmente a análise de sensibilidade, quadro na página 49, não nos permite fazer uma inferência direta sobre o que aconteceria com esse estoque de derivativos caso o dólar vá a R$ 2,50, ou R$ 2,70 por exemplo.
A Companhia adota cenários pouco claros para o leitor que não participa da construção dos quadros. Pode atender ao normativo contábil, mas não deixa a informação de sensibilidade à moeda muito clara para o investidor.
Mas é algo que o investidor pode perguntar à área de Relações com Investidores da VALE, tenho certeza que empreenderão os melhores esforços para atender a demanda.
Infelizmente, e isso é apenas a minha opinião, me parece que a estratégia de uso de derivativos da VALE pode trazer conforto à gestão de fluxo de caixa, mas retira grande parte dos ganhos que a Cia poderia ter com a alta do dólar.
Aos leitores que têm acesso a analistas de corretoras, ou outros que cubram a Cia (costuma ter lista no site da própria empresa), vale conversar com os profissionais para ver a opinião sobre esses instrumentos derivativos “não-hedge”. Se ocorrem há muito tempo, se veem algum risco, caso haja descontrole na taxa de câmbio etc.
Vale também perguntar se esse efeito “não-caixa” poderia virar caixa, caso a VALE tenha que liquidar os derivativos subitamente.
É possível inferir, mesmo sem estar de posse dos termos de todos os contratos, que com o dólar elevado, provavelmente essa perda poderia continuar no 4T14.
Sei que corro o risco de parece injusto, mas não me pareceu uma estratégia bem conduzida, uma vez que a perda é relevante e a necessidade de caixa para serviço da dívida é altamente previsível.
Mesmo que o fluxo de dólares seja altamente previsível para a VALE, seu valor não é.
É algo que vale aprofundar.
Mas para uso no Método SEMPRE, creio que o uso do Lucro Recorrente já seria um ajuste consistente.
Portinho, estou com dificuldades para completar o estudo da TAEE11. Na parte de dados históricos de cotações tenho que preencher ON e PN, mas não sei a relação de unit com ONs desse papel. O que você sugere ?
Carlosos Silva
12/03/2017
http://www2.bmfbovespa.com.br/units/units.aspx?idioma=pt-br
Todas as relações estão aí. Abraço!
Portinho
12/03/2017
Portinho, obrigado pelo link.
Na planilha do SEMPRE anotações de cotações históricas de ON e PN, fiquei pensando se vale a pena eu pegar as cotações da UNIT e dividir por 1/3 e 2/3 respectivamente? Não seria melhor eu colocar apenas as cotações da TAEE11 no lugar da PN e deixar em branco a ON?
Digo isto, porque na Comdinheiro só encontro histórico de cotações da TAEE11. As cotações da TAEE3 e TAEE4 estão tudo como “n/d” no resultado da busca.
Fiquei pensando que se eu fizesse essa conversão de TAEE11 para TAEE3 e TAEE4, seria trabalho à toa. O que você acha? Alguma sugestão? Falta só essa ação para eu finalizar o método SEMPRE de minha carteira ( a única UNIT que tenho )
Carlos Silva
19/03/2017
Oi Carlos, acho que o mais condizente é vc tratar a UNIT como a ON apenas. O que vc precisa fazer é ver quantas UNITs estão emitidas (provavelmente o mesmo número de ONs). Nesse caso a UNIT funciona como uma ON mesmo. Daí basta multiplica sua cotação pelo número de units. A ON e a PN não tem preço de mercado, porque não são negociadas.
Portinho
20/03/2017
Portinho. Uma duvida. Como a gente faz quando temos uma unit? No caso, estou tentando analisar VVAR11 que é composto de 1 ON e 2 PN. Temos cotação da ON mas não da PN. Assim temos a cotação da ON (VVAR3) e da Unit (VVAR11). O que vc sugere? Assumir que a ON e PN são iguais ou extrair o valor da PN a partir da Unit e ON? No caso PN=(UNIT-ON)/2.
Max Scardua
30/11/2014
Oi Max. Creio que no caso da VVAR o ideal seria multiplicar o preço da ON pelo total de ações (1,29 bilhão). Só ficaria atento para ver se há alguma discrepância entre as ON e as UNIT. Se fizer sentido (1 UNIT = aprox 3 ON) não ficaria preocupado.
Portinho
17/12/2014
Boa tarde,
Adquiri seu livro do método SEMPRE e estou começando a esmiuça-lo, mas já posso dizer que no começo ele parece ser um pouco complicado, pelo menos para mim que talvez não tenha a base suficiente para tal.
Enfim, vou continuar, pois quero que meus investimentos em ações tenham qualidade.
Gostaria de saber se já existem planilhas prontas para o uso, ou se faz parte do processo elaborá-las.
Na medida que os problemas forem surgindo vou me pronunciando.
Eduardo Campos
Eduardo Eustaquio Sampaio Campos
10/11/2014
Oi Eduardo,
Pra quem nunca fez traz mesmo alguma dificuldade, mas a ideia é que melhore com o próprio uso.
A ferramenta da ADVFN que deve ajudar a coletar os dados e criar um ambiente virtual de apoio e aprendizado está quase pronta!
Portinho
13/11/2014
Boa noite Portinho,
ainda estou lendo seu livro e restaurando as palestras do método INI. Assim, fica a sugestão de uma abordagem similiar a que nos era oferecida nas palestras. Acredito que para o cidadão comum a abordagem dos itens do artigo não seja uma tarefa fácil. Por isso o método.
Por que não realizar a análise de ponta a ponta, com premissas e até mesmo se é momento de compra, venda ou manutenção em carteira.
Acredito muito que isso possa gerar um excelente aprendizado.
Uma excelente noite para todos,
Marcelo Kastrup
Marcelo Kastrup
06/11/2014
Oi Marcelo,
A ideia é essa mesmo. Quero montar um grupo grande de discussão sobre o Método na ADVFN, como tínhamos no INI.
Tanto assuntos mais espinhosos como os resultados não recorrentes (que lamento ocorrerem com tanta frequência), como análises feitas e debatidas entre os próprios usuários, serão documentados e dabatidos no ambiente virtual.
O Método SEMPRE é mais simples e direto que o Método INI, e também é mais flexível, pois permite tratar esses resultados não recorrentes.
Falaremos bastante sobre isso ainda!
Portinho
07/11/2014
Paulo Portinho, muito obrigado por compartilhar sua visão e informações, tenho seus dois livros, a bolsa em 25 episódios e o método sempre, ambos muito bons. abraço André Beraldo.
Anônimo
06/11/2014
Obrigado André!
Portinho
07/11/2014